Operação no RJ prende 27 policiais...


Policiais federais realizam a Operação Guilhotina, deflagrada com o apoio de 200 agentes da Secretaria Estadual de Segurança Pública.


Publicação: 12 de Fevereiro de 2011 às 00:00
fotos: fabio motta/ae

Rio (AE) - Após um ano e meio de investigações, a Polícia Federal (PF), a Secretaria de Segurança Pública e o Ministério Público do Rio de Janeiro desencadearam ontem a Operação Guilhotina e prenderam 35 pessoas, entre as quais 27 policiais - 19 militares e oito civis, todos suspeitos de envolvimento com traficantes e milicianos. Um dos presos é o delegado Carlos Alberto Oliveira, ex-subchefe Operacional da Polícia Civil e até ontem subsecretário de operações da Secretaria Especial de Ordem Pública da prefeitura do Rio. Outros dez mandados de prisão não tinham sido cumpridos até o início da noite.



Em entrevista ao Grupo Estado, o secretário de Segurança Pública, José Mariano Beltrame, informou que novas operações vão acontecer e que as investigações contra policiais continuam. “No momento em que tem uma operação dessas, eu ouço 45 pessoas, faço algumas ligações. Isso pode ser uma operação aritmética, geométrica e vai embora. E é para isso que eu estou preparado”, afirmou. “Quero que o policial sinta-se supervisionado. É uma mudança estrutural”, disse o secretário.

No início desta semana, Beltrame criou a Superintendência da Contra-Inteligência e entregou ao delegado Cláudio Ferraz, que atuava na Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco), a missão de investigar policiais “Nós tínhamos desafios nestes primeiros anos que já estão postos: UPP, ISP, plano de metas. A sociedade quer outro desafio Agora esta etapa vai ser muito pior do que a primeira. Eu não vou poder deixar de abordar os assuntos internos”, disse Beltrame.

Durante a operação, da qual participaram 580 policiais, foram vasculhadas duas delegacias - 17ª Delegacia de Polícia (DP), em São Cristóvão, e 22ª DP, na Penha, ambas na zona norte -, onde trabalhavam alguns dos presos. Um grupo de mergulhadores da PF procurou, sem sucesso, corpos de possíveis vítimas de milicianos no Piscinão de Ramos e no píer do Iate Clube, no mesmo bairro.

Todos os policiais que tiveram prisão temporária decretada pela 32ª Vara Criminal são acusados de negociar armas, drogas e informações com traficantes; darem sustentação a grupos de milicianos; venderem proteção e segurança a casas de prostituição e roubarem moradores e marginais nas comunidades onde realizaram operações de repressão ao tráfico.

O delegado Carlos Alberto Oliveira foi citado em alguns telefonemas grampeados com ordem judicial e, embora não seja considerado chefe do grupo, segundo o superintendente da Polícia Federal do Rio, delegado Angelo Gioia, há provas que o ligam a policiais corruptos.

O chefe de Polícia Civil, Alan Turnowski, foi interrogado como testemunha sobre sua relação com Oliveira, já que trabalham próximos há dez anos. No Ministério Público há quem questione se ele desconhecia as relações criminosas de seu ex-subchefe operacional. Ao deixar a sede da PF, Turnowski disse que não ver razão para deixar o cargo. “Isso depende do secretário (Beltrame) e do governador (Sérgio Cabral Filho, PMDB). Não tem motivo para eu sair. Não é o momento de sair do cargo. Mas, se sair, saio com a consciência tranquila”, afirmou. O chefe de Polícia Civil chamou Oliveira de “traidor”. “Policial que pega uma arma e vende para bandido é pior que bandido”, disse.

A operação começou em setembro 2009, durante operação frustrada na favela da Rocinha, depois de a ação policial ter sido vazada. Durante a ocupação do Complexo do Alemão, em novembro passado, as escutas telefônicas mostraram os policiais investigados recebendo informações de locais onde os traficantes escondiam armas e drogas. Eles foram filmados entrando nestes endereços e, ao saírem, levavam na mochila o material apreendido que não foi entregue nas delegacias.

Chefe da Polícia é mantido no cargo

Entrevista / José Mariano Beltrame / Secretário de Segurança Pública do RJ

O secretário de Segurança Pública do Rio de Janeiro, José Mariano Beltrame, vai manter Allan Turnowski no cargo de chefe da Polícia Civil, apesar da prisão de colaboradores muito próximos a ele. “Estou atento ao doutor Allan”, disse Beltrame ontem na sua sala na sede da secretaria. “Mas não se joga uma pessoa aos leões sem provas. Ele (Turnowski) faz um bom trabalho na polícia e deu um depoimento seguro na Polícia Federal”, afirmou. Beltrame definiu a operação como “um capítulo feio” na história da polícia carioca. Mas foi firme. “Nós não vamos fazer uma polícia prestadora de serviço com este tipo de gente dentro. E temos que continuar.”

O senhor ainda confia no chefe de Polícia Civil, Allan Turnowski?

Todos nós podemos ser vítimas de acusações. Hoje é ele. Preciso de um mínimo de provas para tomar uma atitude. Ele esteve comigo, foi muito seguro. Ele deu uma grande ajuda, sem ser informado que havia uma operação investigando policiais. Quando o Ministério Público de Macaé conseguiu um mandato de prisão contra um dos réus, que virou testemunha, eu chamei o doutor Allan aqui e disse que queria a prisão dessa pessoa. Ele prendeu a testemunha-chave. Trouxe ela viva, em segurança. Mas eu estou muito atento ao doutor Allan. Esse (apontando para um olho) é irmão desse. A qualquer hora eu posso chegar para ele e dizer: isso aqui você podia ter feito diferente. Por que não fez?

Prender a testemunha-chave foi uma demonstração de que Turnowski é confiável?

Foi uma demonstração de competência. Missão dada é missão cumprida. A gente tem confiança, mas precisa alguma coisa sólida para tomar uma atitude sob pena de num momento desses jogar a pessoa aos leões. Estou acompanhando os depoimentos. No primeiro indício onde eu sentir qualquer coisa comprometedora, eu tomo providência.

Enfrentar polícia é muito pior do que enfrentar bandido?

Não tenha dúvidas. Eu não tomo susto com polícia e com segurança pública. Eu conheço essas instituições desde 2003. Não tem mais nada que me apavore nessas instituições. Se me apavorasse, eu não iria meter a mão onde eu meto. Eu não poderia ficar aqui cinco, seis anos e não mexer nisso. Uma situação dessas me deixa mal, mas eu prometi que ia fazer e fiz. Estou pronto para tocar.

Foi difícil manter o delegado Carlos Oliveira na polícia mesmo sabendo que havia provas contra ele?

A gente tinha um depoimento que citava ele. Mas pode ter pé de pato, bico de pato e ser um ornitorrinco. Tem que ter prova para sustentar as acusações na frente de um juiz. Eu disse ao pessoal: não mexa nele, mas acompanha tudo, controla. Eu prefiro segurar e consolidar. Como diz o gaúcho: “Tá agarrado”.

memória

Rio (AE) - A ação policial realizada ontem foi resultado do vazamento de uma investigação da Polícia Federal (PF) e da Secretaria de Segurança Pública do Rio na Favela da Rocinha, em São Conrado, na zona sul da capital carioca. A operação, realizada em setembro de 2009, acabou fracassando.

O objetivo era prender o traficante Rogério Rios Mosqueira, o “Roupinol”. Morto em 2010, em operação da Polícia Civil, ele foi o principal fornecedor de drogas da favela que abastece a zona sul carioca e também introduziu o método de refino de cocaína, que triplicou os lucros da facção criminosa Amigos dos Amigos (ADA).

“Fui informado de madrugada que dez homens do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) estavam ‘vendidos’ (não sabiam que os traficantes já estavam informados da presença de policiais) nas matas que cercam a Rocinha. Desmobilizamos a operação e acionei a Corregedoria Geral Unificada e a Delegacia de Repressão às Ações Criminosas”, revelou o secretário de Segurança Pública do Rio, José Mariano Beltrame.

Em agosto de 2010, após três depoimentos colhidos pela PF, em Macaé (norte fluminense) e da prisão do informante da Delegacia de Combate às Drogas (Dcod), Magno Carmo Pereira, Beltrame levou o caso ao então diretor-geral da PF, Luiz Fernando Corrêa. As informações davam conta que, depois de ser infiltrado na Rocinha, Pereira mudou de lado e passou a recolher dos traficantes uma caixinha para policiais civis, com valores de R$ 130 mil a R$ 200 mil, em troca de informações sobre incursões policiais. Na ocasião, ele também teria confessado a venda de fuzis por R$ 20 mil para a quadrilha ADA. No entanto, o mais grave é que o informante também revelava o envolvimento nos crimes do delegado Carlos Oliveira, então subchefe operacional da Polícia Civil.

Quatro estruturas criminosas foram descobertas

Rio de Janeiro (AE) - De acordo com as investigações da Polícia Federal (PF) e do Ministério Público do Rio (MP-RJ), quatro estruturas criminosas foram descobertas na investigação. Uma delas seria a “Milícia do Afonsinho”, liderada por Ricardo Afonso Fernandes, policial militar da reserva e parente do inspetor Christiano Gaspar Fernandes, que até esta sexta-feira (11) era o chefe de investigação da 22ª Delegacia de Polícia (DP) da Penha, bairro onde fica uma das favelas controlada pela milícia, a Kelson’s. A delegada titular da DP, Márcia Beck, foi detida nesta sexta-feira (11) para prestar esclarecimentos, depois de flagrada informando a Fernandes sobre a operação por telefone. A delegada e o inspetor já foram agraciados com medalhas de honra pelo chefe de Polícia Civil, Allan Turnowski.

Além de policiais civis, a quadrilha contava com policiais militares que eram “adidos” em delegacias distritais e especializadas e informantes. Entre eles, Magno Carmo Pereira, que atuava como informante da Delegacia de Combate às Drogas (Dcod). Ele foi testemunha-chave para revelar a atuação “multifacetada” das quadrilhas, que atuavam em favelas com milícias; vendiam a traficantes informações sobre operações policiais e o chamado espólio de guerra, ou seja, as armas, drogas e munições apreendidas em operações policiais; além de atuar como segurança de pontos de jogos clandestino, como máquinas caça-níqueis e jogo do bicho. “Os adidos eram uma distorção do sistema para suprir a falta de policiais”, disse o secretário de Segurança Pública do Rio, José Mariano Beltrame.

Entre os integrantes da quadrilha que tiveram a prisão decretada nesta sexta-feira (11) está o inspetor da Polícia Civil Leonardo da Silva Torres, o “Torres Trovão”. Ele ficou conhecido na mídia ao ser fotografado fumando um charuto durante a megaoperação do Complexo do Alemão, em junho de 2007, que resultou na morte de 19 traficantes. Alguns laudos cadavéricos do Instituto de Criminalística Carlos Éboli apontaram suspeitas de execuções.

De acordo com o deputado estadual Marcelo Freixo, que presidiu a CPI das Milícias, a “Milícia do Afonsinho” começou a atuar na Favela Kelson’s após o assassinato do líder comunitário Jorge da Silva Siqueira Neto e da prisão de vários milicianos. Na última quarta-feira (09), Freixo obteve na Assembleia Legislativa do Rio a aprovação para a abertura da “CPI das Armas”. “Vamos chamar os presos nesta operação para depor e os representantes da Polícia Civil, que devem explicações. Afinal, por que transferir para a delegacia da Penha os policiais suspeitos de integrar a milícia em uma das favelas do bairro?”, questionou o deputado.

Fonte:
Permalink http://tribunadonorte.com.br/noticia/operacao-no-rj-prende-27-policiais/172655
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