Ficha Limpa será aplicada integralmente em 2012...



Brasília (AE) - Depois de quase dois anos e 11 sessões de julgamento, a Lei da Ficha Limpa foi considerada constitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e será aplicada integralmente já nas eleições deste ano. Pela decisão do tribunal, a lei de iniciativa popular que contou com o apoio de 1,5 milhão de pessoas, atingirá, inclusive, atos e crimes praticados no passado, antes da sanção da norma pelo Congresso, em 2010. A partir das eleições deste ano, não poderão se candidatar políticos condenados por órgãos judiciais colegiados por uma série de crimes, como lavagem de dinheiro, formação de quadrilha e contra o patrimônio público, por improbidade administrativa, por corrupção eleitoral ou compra de voto, mesmo que ainda possam recorrer da condenação a instâncias superiores.
Ayres Britto indaga: Quem passeia pela passarela quase inteira do Código Penal pode ser candidato?
Também estarão impedidos de disputar as eleições aqueles que renunciaram aos seus mandatos para fugir de processos de cassação por quebra de decoro parlamentar, como fizeram, por exemplo, Joaquim Roriz, Paulo Rocha (PT-PA), Jader Barbalho (PMDB-PA) e Waldemar Costa Neto (PR-SP).

A lei barrará também a candidatura de detentores de cargos na administração pública condenados por órgão colegiado por terem abusado do poder político ou econômico para se beneficiar ou beneficiar outras pessoas. Não poderão também se candidatar aqueles que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos e funções públicas rejeitadas por irregularidades que configurem ato doloso de improbidade.

Pelo texto da lei aprovado pelo Congresso e mantido pelo STF, aqueles que forem condenados por órgãos colegiados da Justiça, como um tribunal de Justiça, permanecem inelegíveis a partir dessa condenação até oito anos depois do cumprimento da pena. Esse prazo, conforme os ministros, pode superar em vários anos o que está previsto na lei.

Um político condenado em segunda instância, como um Tribunal de Justiça, fica inelegível até o julgamento do último recurso possível. Geralmente, o processo termina apenas quando julgado o último recurso contra a condenação no STF. E isso pode demorar anos. Depois da condenação em última instância, ele começa a cumprir a pena que lhe foi imposta, período em que permanece inelegível. E quanto terminar de cumprir a pena, ele ainda estará proibido de se candidatar por mais oito anos.

“Uma pessoa que desfila pela passarela quase inteira do Código Penal, ou da Lei de Improbidade Administrativa, pode se apresentar como candidato?”, indagou o ministro Carlos Ayres Britto. Ele explicou que a palavra candidato significa depurado, limpo. O ministro disse que a Constituição Federal tinha de ser dura no combate à improbidade porque o Brasil não tem uma história boa nesse campo. “A nossa tradição é péssima em matéria de respeito ao erário”, disse. “Essa lei é fruto do cansaço, da saturação do povo com os maus tratos infligidos à coisa pública.”

Lei não atinge vereadores da Impacto

O assunto é polêmico, muitos aspectos jurídicos ainda precisam ser esclarecidos, mas em tese, a Lei da Ficha Limpa, aprovada ontem pelo Supremo Tribunal Federal, não alcançaria os vereadores da Operação Impacto, condenados recentemente pelo juiz Raimundo Carlyle, da 4ª Vara Criminal. Ao todo, foram condenadas 16 pessoas, entre elas cinco vereadores e sete ex-vereadores. No entanto, nenhum desses políticos está impedido de disputar o pleito eleitoral, já que a condenação ocorreu apenas em primeira instância. Todos os condenados da Operação Impacto recorreram ao Tribunal de Justiça. No entanto, como ainda não houve decisão da Corte, eles não estão impedidos de disputarem o pleito eleitoral.

A decisão provocou polêmica entre advogados potiguares. O advogado Erick Pereira considerou que a decisão do STF retroagiu a lei para “dar satisfação ao clamor social”. Ele considerou “perigoso” o precedente criado, apontando para a lei retroagindo e atingindo fatos do passado. Pereira observa ainda que a decisão da Corte poderá gerar questionamentos sobre as condenações de inelegibilidade. Até a sanção da Ficha Limpa os políticos punidos com inelegibilidade permaneciam assim por três anos. A nova lei prevê oito anos.

Erick Pereira afirma que o questionamento surgirá sobre o tempo de inelegibilidade para aqueles que estão em processo de cumprimento da pena.

Já o advogado Felipe Cortez elogiou a decisão do Supremo Tribunal Federal. Ele disse que a sociedade “inteira aguardava a posição”. O advogado ressaltou ainda que as decisões anteriores da Corte já apontava que a lei da Ficha Limpa seria validada.

O advogado Erick Pereira definiu a decisão do STF como um “precedente perigoso” que está sendo criado na história do Direito brasileiro. “A lei é benéfica e deveria ter seus efeitos prospectivos como toda norma, não retroagir para dar satisfação a um clamor social”, analisou.

Ele disse que com o precedente criado pelo STF “amanhã poderemos ter leis causuísticas e que atinjam o cidadão”. “O precedente está aberto, a lei pode retroagir para atingir fatos pretéritos, em termos acadêmicos e doutrinário essa decisão gerou perplexidade”, analisou.

Pereira avaliou que em termos sociais a decisão do STF atingiu exatamente o desejo da população. “O fato que se gerou é que os agentes políticos repensem a imagem deles, não está se discutindo juridicidade e sim o aspecto sociológico”, disse o advogado.

O advogado observou que o STF julgou diante do clamor para criar um efeito político negativo, suspendendo os direitos políticos e gerando “consequência de um dano inevitável”.

Erick Pereira observou que mesmo com a decisão do STF a lei ainda está passível de questionamento, já que há indefinição sobre aqueles que foram condenados por inelegibilidade. Antes o período era de três anos, com a nova legislação passa a ser de oito anos. “Como fica no caso de quem está cumprindo o tempo de três anos? Aumenta para oito?”, ponderou.

O advogado Erick Pereira não acredita que a lei da Ficha Limpa terá dificuldades para ser cumprida. “A fiscalização é direta pelos partícipes do pleito, não há dificuldades para encontrar as condenações na internet e no rol do Tribunal de Contas do Estado”, comentou.

O advogado Felipe Cortez segue argumentação exatamente contrária a de Erick Pereira. Ele disse que a decisão do Supremo validando a Ficha Limpa era aguardada há muito. Observou, inclusive, que as decisões favorecendo os senadores Jáder Barbalho e Cássio Cunha Lima, que embora condenados foram empossados no Congresso, só ocorreu pelo princípio da anterioridade, ou seja, a lei foi sancionada há menos de um ano antes do pleito de 2010.

“O Supremo já havia sinalizado que a lei seria válida, com essa decisão muitos ex-prefeitos ficarão de fora das eleições, a lei é rigorosa”, comentou Cortez.

Ele analisou que com a decisão não há como recorrer. “O Supremo deu a última palavra; a consultoria que vou dar aos meus clientes é para não insistirem (com a candidatura sendo ficha suja) não tem o que fazer”, completou o advogado.

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