Ponto de mutação – Mutatis Mutandis...


Há um assunto na cidade sendo comentado por todos: a Polícia Militar no RN está fazendo valer a chamada “Lei Seca”.

A mudança no padrão de comportamento foi sentida principalmente durante o atual veraneio nas praias do litoral sul do RN, em que a fiscalização da conduta de motoristas que ingerem bebida alcoólica antes de dirigir tem gerado a apreensão de dezenas de carteiras de motorista, a imposição de multa aos infratores e, o que tem provocado maior burburinho, a realização de inúmeras prisões em flagrante dos condutores, em decorrência da prática do crime de direção de veículo automotor com concentração de álcool no sangue acima do permitido (art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro).

Entre os inúmeros agraciados com a voz de prisão, alguns despertam mais a curiosidade pública do que outros. Tem sido comum, nas rodas natalenses, o questionamento a respeito de quem foi o promotor, o juiz, o deputado, o empresário etc, que foram flagrados na prática da conduta criminosa. Mais espantoso ainda, para os curiosos, é estar a PM fazendo valer a lei para pessoas de tão elevado status na pirâmide social de nossa “província”.

Há dois modos de ver a vida: um olhando para os atores no palco; o outro, olhando para o princípio descortinado pela cena. A mim, sempre interessou o princípio das coisas, o que está no fundamento dos fenômenos, o que verdadeiramente motiva os homens a agir, ainda que estes não o conheçam ou não o aceitem.

E o princípio é sempre o verbo – uma ideia, um projeto, um caminho que se decidiu traçar, mesmo que inconscientemente. É quando muda tal ideia que os homens e suas Instituições se revolucionam, para o bem ou para o mal.

O observador mais atento da cena pública percebeu, no segundo semestre de 2011, que algo havia mudado na Polícia Militar do RN. Nas operações Batalhão Mall, Sinal Fechado, Pecado Capital, Q.I. e Mensalão da Vila, de amplo conhecimento público, os coturnos acostumados antes à lama e à poeira de repente entravam em apartamentos com requintados tapetes, e os mandados de prisão, antes lidos perante descamisados, agora eram apresentados a recém acordados pijamas de seda.

O soldado, o cabo, o sargento e o tenente, sempre muito acostumados e intimidados pelo “você sabe com quem está falando”, de repente cumpriam mandados judiciais de busca e apreensão no apartamento de seu anterior “comandante em chefe”, fazendo valer a ordem judicial e a lei contra quem tinha recentemente o poder supremo de mando na Instituição.

E o melhor. Em ações envolvendo, como investigados, coronéis da própria PM, empresários, políticos de fina pluma, servidores públicos de alto escalão e até ex-governadores do Estado, o emprego quase sempre de mais de duzentos homens de diversos postos e graduações se fez sem que um sequer vazamento fosse detectado. Nada. Sigilo absoluto. Sucesso total.

Fez-se, então, a luz; encontrou-se o ponto de mutação. Com a ação, ganhou-se dignidade. Na dignidade, sobreveio o reconhecimento, o louvor – subsídio aprovado no encerramento do ano de glórias. Ganhou-se o pão do próprio suor.

Daí a prender promotores, juízes, deputados em blitze foi só uma questão de tempo.

Ou melhor, de princípio.

Por Alexandre Gonçalves Frazão – Promotor de Justiça do GSI/GAECO – MPRN.

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