Todas
as polícias brasileiras fazem parte do grupo de instituições públicas
com o funcionalismo organizado em carreira, o que significa que todos
os policiais possuem – em tese – a perspectiva de galgar postos,
graduações ou classes que garantam uma evolução financeira e funcional à
medida que seu tempo de serviço aumenta. Diferentemente do mero
“emprego”, onde o trabalhador geralmente se mantém visando apenas
algumas necessidades imediatas de sobrevivência, a carreira privilegia a
convivência do servidor com a organização a que pertence, dado o
horizonte de crescimento do indivíduo no interior da instituição.
O
problema é que, em algumas polícias brasileiras, esta diferenciação
entre carreira e emprego parece não mais existir, dado que, desde o
início de suas trajetórias, muitos profissionais já vislumbram certo
“engarrafamento” que lhe impedirá a progressão funcional. Geralmente por
descumprimento do que manda a lei e por excesso de considerações
políticas, sem falar na sanha de “corte de gastos” que geralmente
acomete o Estado (sempre do “lado mais fraco”), promoções deixam de
ocorrer, com efeitos tenebrosos para as corporações policiais:
A monotonia da função
Embora
muitas pessoas passem anos a fio com a mesma rotina no seu dia-a-dia,
dificilmente se dirá que alguém com este perfil consegue ser inovador,
dinâmico e versátil no que faz. A falta de perspectiva de crescimento
funcional garante ao policial o estereótipo do que ficou definido pelo
imaginário popular como “funcionário público”: um burocrata repetitivo,
receoso de mudanças e inovações, imerso na monotonia de suas práticas,
conhecidas e mantidas há muito tempo.
O sentimento de injustiça
Quando
está na lei que o policial irá ser promovido em dada altura de sua
carreira, e esta promoção não ocorre, consolida-se aí uma frustração,
que gera o sentimento de injustiça, que por sua vez será convertido em
desmotivação e prejuízo ao serviço prestado. É parte essencial do ser
humano projetar o futuro, e não há aquele que desconsidera uma
possibilidade de ascensão profissional quando vem preenchendo todos os
requisitos para este movimento.
O descompasso institucional
Se
um policial com a função “B” é responsável pela fiscalização do
policial com a função “C”, e de repente aquele primeiro é promovido
enquanto o “C” permanece no mesmo grau, mesmo preenchendo os requisitos
para a promoção, a tendência é que as engrenagens da corporação
policial comecem a se desgastar. Este tipo de desarmonia afeta
fortemente os mecanismos de controle e gestão de qualquer
administração.
As recompensas desviantes
Muitas
vezes, visando compensar a falta de promoção, que se bem aplicada
garante dignidade profissional a uma categoria, expedientes informais
são adotados, principalmente em se tratando de nomeações e exonerações
em cargos comissionados ou mesmo de direcionamento a funções menos
“desgastantes”. É como se a corporação vivesse se desculpando por suas
falhas aos policiais que, pouco reconhecidos conforme prevê a lei,
acabam se agarrando a benesses passageiras e instáveis, distribuídas a
partir de critérios duvidosos.
O desapego
Existe
um sentimento de “posse” que é fundamental ao bom relacionamento entre
o profissional e a organização em que trabalha. Não se trata da mesma
posse que rege as relações da propriedade privada, mas aquela que
garante certo cuidado do servidor público com a estrutura e os serviços
sob sua responsabilidade. Ao perceber que está sendo preterido por
motivos ilegítimos, a tendência é que o profissional abdique deste
sentimento de intimidade e identidade com o que é público.
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Neste
contexto, onde o profissional é tratado como empregado, e não como
funcionário de carreira, cobra-se o empenho e a dedicação proporcional a
este último status, ao tempo em que se critica aqueles que mantêm uma
relação proporcionalmente indiferente com sua corporação. Sem
justificar desvios de conduta nem omissões, é de se questionar por que
os profissionais, individualmente, são os responsáveis por compensar
distorções orgânicas e estratégicas das instituições a que servem.
NOTA
DO BLOG: A Polícia Militar do RN assiste hoje uma PM composta em sua
grande maioria em Soldados, os quais não possuem qualquer possibilidade
de ascensão profissional, haja vista o Governo alegar a LRF para não
promover os policiais. São anos sem concursos, no mínimo uma década no
caso da ascensão à graduação de Cabo PM, e aumenta quando o assunto é
Sargento. Atualmente, a PMRN não possui qualquer política de ascensão
profissional, congelando o seu quadro organizacional. São mais de 800
vagas para a graduação de Sargentos e 1.300 para a graduação de Cabos,
vagas estas que com certeza estão sendo exercidas por Soldados.
Por Danilo Ferreira, via Abordagem Policial