Violência contra as mulheres...


Rotina de dor, medo, dúvidas e coragem

Publicação: 13 de Abril de 2014 às 00:00 | Comentários: 0
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Daísa Alves - Repórter

Faltava meia hora para o início de expediente, às 8h, e já haviam mulheres na porta da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam), da Ribeira. A primeira a chegar, às 6h30, se antecipou por medo de que o agressor a visse indo à delegacia. Há duas semanas Luíza decidiu denunciar o sobrinho, do qual recebeu uma pedrada no rosto. Nesse dia, ela comparecia a unidade para prestar depoimento após boletim de ocorrência. O nome de Luíza é fictício, como os das outras mulheres com suas histórias narradas nesta reportagem.

Nesse dia, na Deam Sul, a demanda era de pessoas agendadas para depoimentos: vítimas, acusados ou testemunhas. Já a sala para registro de Boletim de Ocorrência, fez o primeiro atendimento por volta das 11h. Uma quinta-feira, é mais calmo. Segundo os policiais, na segunda e terça-feira as queixas são mais frequentes, pois no final de semana a delegacia fica fechada.

Atendimento

Um dos primeiros a recepcionar as mulheres é o agente João Maria Silva. Seus onze anos de experiência na delegacia moldaram sua maneira de observar o papel da polícia em defesa social.

 “Esta delegacia é diferenciada. As pessoas não vem relatar só perda material. É algo íntimo. Às vezes, é a última saída delas”, diz. No seu birô, uma coleção de lágrimas, como as de Márcia (54) que tomou coragem para ir até a delegacia, mas não o suficiente para prestar queixa. “A senhora quer que eu coloque uma investigação criminal? A decisão está nas mãos da senhora”.

Ela não quis prestar queixa, mas, se porventura uma testemunha o fizesse, vale da mesma maneira, desde 2012. Para retirada de queixa, também houve mudanças. Há dois anos, não é possível mais desafazer um b.o. de violência doméstica. Apenas em alguns casos, perante o juiz.

Dificuldades

O abrir e fechar da porta da delegacia está tão dificultoso quanto os serviços policiais. O trinco emperra se você dobra-lo de imediato. É preciso segurar,  empurrar para a direita e levantar a porta com jeito. Aos roídos, a vidraça emoldurada de alumínio se abre. A desenvoltura e habilidade faz parte do dia-a-dia da Deam Sul. Contando com um efetivo de duas delegadas, três escrivães e oito agentes policiais eles atendem as zonas Sul, Leste e Oeste de Natal. Segundo dados do censo do IBGE em 2010, estas três regiões somam 267.841 mil mulheres.

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Boa vontade e dedicação é o combustível da equipe para o dia que começa com uma pilha de boletins de ocorrência, inquéritos e processos. A chefe de investigação, Cláudia Cristiane, lamenta não estar em campo, e em vez disso, fazendo o chamado trabalho de cartório. Na mesa, quinze inquéritos para dar encaminhamentos.

Investigação

O trabalho de investigação deveria se direcionar aos homicídios, estupro e diligências para descoberta do paradeiro dos suspeitos. A equipe de investigação, colhe também a demanda de notificações das vítimas e acusados. Na Deam Sul, em 2012, foram 19 casos de estupro e 1 de homicidio, e no geral, 121 inquéritos abertos; em 2013, no registro de janeiro a junho, foram 18 casos de estupro e 2 de homicídios, e no geral 376 inquéritos. Neste três primeiros meses, já estão registrados 205 inquéritos, e 695 B.O.’s.

“A situação é precária, o atendimento estrutural é muito deficitário. Temos perdido policiais nestes último dois anos”, diz a delegada titular da Deam Natal Sul, Karen Lopes. Dez agentes foram extraídos da unidade, por aposentadoria ou requalificação, sem reposição de efetivo à unidade. Para o serviço, estão sem viatura; as duas estão quebradas, uma ficou encostada e segunda está no conserto.

Prazos

Segundo a delegada, não há como cumprir os prazos estabelecidos em lei. Uma medida protetiva, que deveria sair em 48h, demora de quinze a vinte dias, entre B.O., encaminhamento ao juizado e deferimento. De acordo com Cícero José vitoriano, diretor substituto da Juizado de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher em Natal, em média, seis medidas protetivas são expedidas por dia.

“O raro são as condenações, tem muita prescrição. Tem mais de duzentas caixas, com inquéritos prescritos”, contabiliza. Ele relata dificuldade com a pequena equipe de cinco servidores e grande demanda.

Enquanto isso, tramita já na mesa do Governo do Estado, segundo Erlândia Passos, coordenadora do Codimm, uma minuta que pede o afunilamento dos atendimentos pelas Delegacias Especializada de Atendimento à Mulher. No caso, apenas crimes de gênero, violência doméstica e estupro. Para ela, a lei em defesa das mulheres está mais credibilizada, o que transparece nas estatíticas com aumento de queixas. No caso dos homicídios, ela acredita que os crimes urbanos colaboram para os altos números.


SOS MULHER E IDOSO (RN)
0800-281-2336

SOS MULHER NACIONAL
180


Tribuna do Norte

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