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POLÍTICA DE SEGURANÇA

Construir uma polícia ideal é uma tarefa trabalhosa e, segundo especialistas, envolve melhorias em vários setores: no treinamento dos oficiais, na credibilidade e na gestão das corporações, na prevenção e no planejamento do trabalho policial, no mapeamento das zonas de perigo, na prisão de mais bandidos e na integração do sistema de justiça criminal para que o criminoso seja mantido encarcerado.

De fato, o trabalho integrado e os resultados que a sociedade espera depende mais de políticas de segurança que da quantidade de instituições. A situação atual das polícias brasileiras mostra que um horizonte de unificação está a anos-luz de distância. As ações mais efetivas percebidas como “trabalho da polícia” têm, antes das prisões e da exibição do distintivo, empenho de integrantes do Ministério Público e da Justiça e investimento em estruturas de inteligência e produção e análise de estatísticas de criminalidade – algo que a maioria dos governos estaduais não leva a sério, como mostra o último Anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

O outro desafio das polícias e dos policiais é fazer com que a sociedade os perceba mais como servidores públicos do que como guerreiros, ou agentes associados a truculência e risco para o cidadão. “É importante entender que o trabalho de um, o policial, é complementado pela colaboração do outro, o morador”, afirma a antropóloga e professora da UERJ Alba Zaluar.

“De um sistema centralizado e militar, focalizado no incidente após ele ter acontecido e na contenção do criminoso, precisamos passar a outro descentralizado, localizado e focalizado no cidadão, dedicado a resolver problemas comuns dos moradores locais e a prevenir o crime ali”, diz Alba Zaluar. Especialistas afirmam que esse processo precisa começar na formação do policial e ser acompanhado por uma reciclagem completa do efetivo atual.

REVISTA VEJA

UNIFICAÇÃO DA POLÍCIA MILITAR E CIVIL

Especialistas ouvidos pelo site de VEJA apontam duas alterações necessárias para aproximar a polícia do seu ideal. Uma das discussões que reaparece de tempos em tempos é a unificação das forças policiais estaduais, algo complexo e ainda distante da realidade, por mesclar a realidade dos quartéis da Polícia Militar com as regras da Polícia Civil. Para os defensores da fusão, há benefícios financeiros, burocráticos e operacionais na fusão das instituições. E, em tese, a unificação poderia acabar com disputas de poder, como se viu no Rio de Janeiro no fim do ano passado. Outra corrente defende, em vez da fusão, a maior integração entre as corporações.

A Constituição de 1988 designou a Polícia Militar para as atividades de patrulhamento e a Polícia Civil para a investigação. Para alterar as atribuições, o instrumento necessário é uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC). O sociólogo Claudio Beato classifica a divisão de “terrível” e critica a indefinição do papel de cada corporação. “O fracionamento da atividade policial cria áreas de conflito, pois uma passa a patrulhar e outra a investigar. É preciso mudar a Constituição e fazer a junção entre as polícias”, afirma.

O jurista e cientista político Jorge da Silva, professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), apresenta algumas alternativas. Uma delas é o modelo europeu, onde, por exemplo, a Gendarmerie francesa e os Carabinieri italianos executam, além das atividades ligadas à defesa interna, as funções de polícia nas cidades interioranas. As regiões metropolitanas contam com um corpo policial específico. “Só um país rico como o Brasil pode se dar ao luxo de ter duas polícias que têm conflitos interesses. Isso é uma dicotomia única no mundo. Embora a unificação completa apresente desvantagens, ela oferece mais vantagens, como a eliminação dos conflitos institucionais”, afirma Silva.

Ex-ministro da Justiça, o senador Aloysio Nunes (PSDB) é contra a unificação. “Quando eu era ministro, houve uma tentativa de unificar as polícias, porém a ideia é inviável. É preciso fazer uma integração operacional, de informação e de formação entre os dois ramos”, afirma. “O processo de unificação seria muito doloroso e beneficiaria apenas o crime”, adverte, baseando-se nas conhecidas investidas do banditismo nos momentos em que há fragilidade entre as organizações que combatem o crime.

O coronel Camilo tem a mesma visão: “Não é o maior ou o menor número de corporações que vai resolver o problema, mas o emprego de cada uma delas”, defende.

VEJA

POLÍCIA IDEAL

Autoridades e especialistas em segurança pública são unânimes em dizer que a polícia ideal é aquela que consegue manter a ordem e garantir o cumprimento das leis ao mesmo tempo em que respeita os direitos humanos e consegue ser próxima do cidadão. Para tanto, precisa ser bem treinada, receber remuneração adequada e contar com uma corregedoria forte. Levantamentos recentes sobre o setor mostram que a realidade passa longe disso. Pesquisa do Fórum Econômico Mundial sobre a solidez de diversas instituições, divulgada em 2011, revela que a polícia brasileira ocupa a 66ª posição entre 142 países – a posição é pior que a de Vietnã e Ruanda, por exemplo.

Os índices de criminalidade estão caindo nos últimos anos no Brasil, especialmente em metrópoles como São Paulo. Segundo a Secretaria de Segurança Pública (SSP), em 2011, por exemplo, o estado de São Paulo fechou o ano pela primeira vez abaixo da taxa de 10 homicídios por grupo de 100 mil habitantes. Mesmo assim, a percepção da sociedade brasileira em relação aos responsáveis pelo combate à violência ainda é ruim. Segundo levantamento feito pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) em 2010, a polícia brasileira foi considerada lenta, ineficiente, incompetente, desrespeitosa e preconceituosa pela maioria dos entrevistados.

“A Polícia Militar tem uma imagem herdada da ditadura, quando era uma caixa- preta e impunha medo ao cidadão”, afirma o sociólogo Claudio Beato, professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). “De certa forma, a polícia continua como uma incógnita para a população até hoje. A nossa policia se distanciou muito do cidadão.”

Esse estigma se reflete no nível de confiança da população. Um levantamento encomendado pela Rede Nossa São Paulo ao instituto Ibope mostra que 55% dos paulistanos não confiam na PM, índice que oscilou pouco nos últimos anos. Na pesquisa do Ipea, a rejeição da PM em todo o país é a maior entre as corporações policiais: 27,7%, enquanto a Civil tem 25,9% e a Federal 17,5%.

Comandante-geral da PM paulista , o coronel Álvaro Camilo reconhece a fama da corporação, mas se defende. “O cidadão espera que o policial seja uma espécie de homem perfeito”, afirma. “Nós tentamos mostrar que ele é um homem comum que está suscetível a erros. Se tiver ocorrido algum excesso, vamos investigar e punir os infratores.” A PM de São Paulo é a maior do país, com um efetivo de 85 000 homens.

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