Moradores se dizem vítimas de violência de policiais em UPP do Rio...

 G1

Moradores se dizem vítimas de violência de policiais em UPP do Rio

Testemunhas afirmam que, antes de Amarildo desaparecer, já existia a prática de abusos e torturas no posto da Polícia Militar da favela da Rocinha.

Amarildo de Souza é o ajudante de pedreiro que sumiu, em julho, quando foi detido por PMS na Unidade de Polícia Pacificadora da favela da Rocinha, no Rio.
Repórteres do Fantástico localizaram testemunhas que afirmam: antes de Amarildo desaparecer, já existia a prática de abusos e torturas no mesmo posto da Polícia Militar.
As denúncias foram feitas ao Ministério Público e dão pistas importantes para solucionar o caso.
O desaparecimento de um ajudante de pedreiro em julho, no Rio, ganhou repercussão nacional. Na internet e nas ruas de várias cidades brasileiras, uma mesma pergunta: “Cadê o Amarildo?".
Policiais militares da Unidade de Polícia Pacificadora da Rocinha são suspeitos de torturar e matar Amarildo de Souza e de terem escondido o corpo. Mas por quê? A resposta pode estar em denúncias feitas ao Ministério Público por moradores que se dizem vítimas da violência de policiais da mesma UPP, instalada na Rocinha há um ano.
A PM vinha levantando informações sobre o tráfico na favela para uma operação batizada de ‘Paz Armada’. A operação aconteceu um dia antes de Amarildo ser levado à UPP e nunca mais ser visto.
“Eu ouvi mãe de família dizendo que a polícia entrava a qualquer hora, do dia ou da noite, em suas casas, dizendo que havia suspeita de que ali havia um depósito de drogas. Traziam para fora da casa adolescentes para fazer perguntas e pressionar sobre informações de onde estariam as armas ou as drogas”, declara a promotora de Justiça do RJ Gláucia Costa Santana.
“Choque na cara, no peito, no pescoço, nos braços”, diz uma testemunha.
Um dos autores das denúncias é menor de idade e responde a uma ação no Juizado da Infância e da Juventude por associação ao tráfico.
“Me enquadraram na viela aqui embaixo, em uma pracinha perto da minha casa. Aí me enquadraram e, nisso, perguntaram onde estavam os traficantes. Não sabendo, eles me deram uma banda. Pegaram uma sandália do meu pé, aí começaram a me dar tapa na cara, com a sandália na minha cara”, ele diz.
Segundo o rapaz, isso foi só o começo: “Me arrastaram para o beco mais escuro. Aí começaram a me agredir. Botaram saco na minha cabeça, me molhando, dando choque”, conta.
A tortura foi testemunhada por uma pessoa que conhecia o jovem. Ela avisou a um parente da vítima. Somente quando esse parente chegou ao local o rapaz foi liberado.
O rapaz afirma que, no dia 13 de julho, véspera do desaparecimento de Amarildo, foi levado para o Centro de Comando e Controle da UPP durante a operação ‘Paz Armada’.
“Me levaram para a dentro do banheiro. Chegou dentro do banheiro, começaram a me bater, botaram a minha cara dentro do vaso”, ele relata.
Na versão dele,  a sessão de tortura só acabou porque mais uma vez parentes apareceram.
Você vê no vídeo o momento em que um jovem que trabalha como auxiliar de serviços gerais é dominado por um PM com uma gravata. Moradores protestam, mas o policial não o solta. Eles vão para o chão. Instantes depois, o rapaz se levanta e, cercado por PMs, leva outra gravata. A situação dura pelo menos sete minutos. Quando o vídeo acaba, ele está sentado no chão, algemado.
O auxiliar de serviços gerais estava na rua mais movimentada da Rocinha a espera do ônibus que o levaria ao trabalho. Foi onde ele encontrou PMs que faziam o patrulhamento.
“Eles me chamaram, pediram para revistar minha mochila e pediram meu documento. Falei: ‘meu senhor, sou trabalhador, tenho carteira assinada, não devo nada, pode puxar aí’. Aí eles: ‘não, vamos ali’. Aí eu falei que não ia. Ele me pegou na gravata e foi o que aconteceu.”, ele diz.
Isso aconteceu em abril, mesmo mês em que o líder comunitário Carlos Eduardo Barbosa e um grupo de moradores levaram as primeiras denúncias de torturas na UPP ao Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos.
Carlos Eduardo só concordou em falar ao Fantástico se pudesse mostrar o rosto. Ele explica por quê: “O meu medo hoje é continuar invisível, continuar em um beco não sendo visto, e ninguém sabendo o que está acontecendo com a gente”.
Ele afirma que o irmão foi confundido com um traficante e espancado: “Os policiais começaram a bater no rosto dele, deram tapa na cara, pegaram na garganta dele e apertaram, deram soco na barriga dele. Ele começou a ficar com falta de ar e falando que não sabia o que estava acontecendo. Por sorte, duas vizinhas fizeram barulho na janela e perceberam o que estava acontecendo”, ele relata.
As denúncias foram encaminhadas ao Comando Geral da PM e ao comando das UPPs. Segundo o Conselho de Direitos Humanos, os comandantes informaram que estavam cientes do que estava acontecendo na Rocinha. Quase três meses depois das primeiras denúncias, Amarildo desapareceu.
Para a promotora que investiga as denúncias de tortura, a busca da polícia por informações sobre o tráfico não deu certo. Segundo a promotora, essa busca levou à detenção e ao desaparecimento (morte) de Amarildo.
Em nota, a Polícia Militar diz que "não deixa de apurar nenhuma informação concreta que chega ao Comando das UPPs sobre má conduta de policiais".
Também em nota, a Secretaria de Segurança afirma que “a UPP da Rocinha é bem avaliada pelos moradores e que acompanha com atenção a evolução dos trabalhos do Ministério Público”.
“O projeto Unidade de Polícia Pacificadora é um sonho de todo mundo. Nós apostamos nele. Nós não queremos que o que aconteceu na Rocinha se repita em outras Unidades de Polícia Pacificadora”, afirma a promotora.
Dias depois do sumiço de Amarildo, quatro PMs foram afastados da UPP da Rocinha. Já o major Edson Santos deixou o comando da UPP no  início deste mês.
A mulher e os seis filhos de Amarildo abandonaram a casa de um cômodo em que moravam.
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