Indígenas e policiais frente a frente na estrada que dá acesso à fazenda (Foto: Tatiane Queiroz/G1 MS)
O governo de Mato Grosso do Sul afirmou, por meio de nota divulgada
nesta quinta-feira (30), que a Polícia Militar “não utiliza arma letal”
durante a reintegração de posse de uma fazenda ocupada em Sidrolândia, a
70 km de Campo Grande. O conflito entre indígenas e policiais durante a
operação deixou um índio morto e vários outros feridos, segundo o
coordenador local da Fundação Nacional do Índio (Funai), Jorge das
Neves.
A Polícia Federal cumpre o mandado de reintegração de posse da fazenda
Buriti, ocupada pelos índios terenas desde 15 de maio, com apoio da PM.
PF diz que os terenas se recusam a deixar a área e que, inicialmente,
reagiram com armas de fogo. Alguns agentes da PF também ficaram feridos.
Segundo o governo estadual, a tropa da Companhia de Gerenciamento de
Crises e Operações Especiais (Cigcoe) é “especializada em atuar nessas
condições, o que inclui a utilização dos equipamentos adequados para
proteção do policial e o
emprego de armas com munição unicamente do tipo elastômero (balas de borracha)”.
O comando da PM, de acordo com o governo, teria recebido informação da
Polícia Federal de que contra os policiais teria sido utilizada arma de
fogo.
O governador André Puccinelli (PMDB) pediu, ao general Roberto
Sebastião Peternelli Junior, que está substituindo o ministro-chefe do
Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, José
Elito Carvalho Siqueira, intervenção imediata do governo federal para
que a situação seja resolvida.
Reintegração de posse
O clima na área é de confronto. PMs da Companhia Independente de
Gerenciamento de Crises e Operações Especiais (Cigcoe) usam balas de
borracha e bombas de efeito moral para tentar controlar e retirar do
local os índios, que estão armados com lanças e revidam atirando pedras.
Ao ocuparem a fazenda Buriti, os índios entraram também em outras três
propriedades - Santa Helena, Querência e Cambará - mas já deixaram estas
áreas.
O Hospital Elmíria Silvério Barbosa, em Sidrolândia, confirmou a morte e
a transferência de um dos feridos para a Santa Casa em Campo Grande.
Outros três indígenas permanecem hospitalizados em Sidrolândia.
A sede da fazenda chegou a ser incendiada pelos indígenas, mas o fogo foi controlado pelo Corpo de Bombeiros.
Lideranças indígenas disseram ao
G1 que foram surpreendidos pelas equipes da polícia. Já a PF diz que tentou negociar a saída dos terena antes da reintegração.
O acesso para a propriedade está bloqueado. Foram encaminhados para o
local quatro ônibus e pelo menos cinco viaturas do Cigcoe, pelo menos
dez viaturas da Polícia Federal e duas dos Bombeiros. Após o confronto, a
PM mandou mais equipes para o local, de acordo com o comandante da
corporação, coronel Carlos Alberto David dos Santos.
“Determinei a ida das equipes táticas de três batalhões de Campo
Grande. Mandei também mais policiais da Cigcoe e mais munições”,
afirmou. Segundo ele, a decisão foi tomada após a informação de que os
terenas incendiaram a sede da fazenda e resistiram à desocupação. A
quantidade de agentes não foi divulgada.
Cacique mostra ferimento nas costas após confronto com policiais (Foto: Tatiane Queiroz/G1 MS)
Conflito
A fazenda Buriti foi a primeira a ser ocupada, no dia 15 de maio, e
única que ainda continua com indígenas dentro de seus limites. Os terena
também chegaram a entrar em outras três propriedades, já desocupadas.
Um mandado de reintegração de posse para a Buriti foi expedido pela
Justiça no mesmo dia da invasão, mas foi suspenso no último dia 20 em
razão da reunião de conciliação que já estava marcada para quarta-feira
(29).
Segundo a Funai, os indígenas reivindicam aceleração do processo de demarcação e não querem deixar o local.
Sem acordo
Indígenas e produtores reuniram-se em audiência de conciliação na
quarta-feira, mas não houve acordo e a Justiça determinou, então, que a
desocupação fosse imediata.
Ronaldo José da Silva, juiz substituto da 1ª Vara Federal de Campo
Grande, afirmou que a reunião foi "infrutífera", estipulou multa diária
de R$ 10 mil para as pessoas que impedirem o cumprimento da
reintegração de posse e determinou que a Fundação Nacional do Índio
(Funai) comunicasse os índios sobre a decisão.
Briga judicial
A Terra Indígena Buriti foi reconhecida em 2010 pelo Ministério da
Justiça como de posse permanente dos índios da etnia terena. A área,
localizada entre Dois Irmãos do Buriti e Sidrolândia, foi delimitada em
portaria publicada no Diário Oficial da União (DOU) e abrange 17.200
hectares.
Após a declaração, o processo segue para a Casa Civil, para a
homologação da presidência da República, o que ainda não foi feito.
Durante nove anos, as comunidades indígenas aguardaram a expedição da
portaria declaratória. O relatório de identificação da área foi aprovado
em 2001 pela presidência da Funai, mas decisões judiciais suspenderam o
curso do procedimento demarcatório.
Em 2004, a Justiça Federal declarou, em primeira instância, que as
terras pertenciam aos produtores rurais. A Funai e o Ministério Público
Federal recorreram e, em 2006, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região
(TRF-3) modificou a primeira decisão e declarou a área como de ocupação
tradicional indígena.
No entanto, os produtores rurais entraram com recurso de embargos de
infringentes e conseguiram decisão favorável em junho de 2012.
G1