Publicação: 30 de Junho de 2013 às 00:00
Rafael Barbosa - Repórter
O Rio Grande do Norte
dispõe somente de 12 delegacias, sendo duas na capital, que funcionam em
regime de plantão. Elas precisam dar conta das ocorrências dos 167
municípios do estado, no entanto apenas em Natal e Mossoró essas DPs têm
equipes específicas. Para as demais cidades, as Delegacias Regionais
(DPRs) são as responsáveis pelo serviço oferecido fora do horário
comercial de segunda a sexta-feira, atuando com o próprio efetivo.
Nos
finais de semana, elas contam com auxílio de profissionais lotados em
delegacias distritais localizadas dentro de sua área cobertura, que não
recebem por esse
trabalho extra.
O problema se agrava ainda mais quando esses delegados respondem por
DPs de mais de um município. Há casos em que eles acumulam o trabalho em
até 11 delegacias.
Com equipes defasadas e insuficientes para a
demanda de ocorrências, as Delegacias de Plantão das zonas Sul e Norte
de Natal são um “quebra-galho” para a população durante as madrugadas e
os finais de semana e refletem o problema de todo o RN. A reportagem da
TRIBUNA DO NORTE acompanhou por uma noite os profissionais das duas DPs e
pôde constatar a dificuldade encontrada pelos agentes e delegados da
Polícia Civil para o desempenho de seu trabalho.
Magnus NascimentoAlém da falta de infraestrutura e equipamentos, as delegacias de polícia do RN trabalham com baixo número de policiais civis
O
acompanhamento começou às 18h, na Plantão Zona Sul. Em um dia incomum
no que diz respeito à quantidade de crimes cometidos, segundo os
agentes, até as 6h da manhã do dia seguinte havia-se feito 25 registros,
entre Boletins de Ocorrência e Termos Circunstanciados. Um número
considerado baixo. Foram três assaltos a transporte coletivos,
atendimento mais recorrente durante as noites. Houve também um
homicídio, além de registro de agressão e roubos.
O caso do
assassinato denota a falta de infraestrutura. A equipe do plantão era
composta por oito agentes, dois escrivães e um delegado. No momento em
que foi preciso deslocar parte do pessoal para Ponta Negra, às 20h, para
que se fizesse a averiguação do local do crime de execução, a DP ficou
com quatro policiais para atender toda a demanda. A Plantão Zona Sul é
responsável pelos registros de ocorrências das zona Sul, Leste, Oeste da
capital, além das cidades de Nísia Floresta e Parnamirim, na região
metropolitana.
O relato de um dos agentes, que não quis se
identificar, bem como o restante dos homens que trabalhavam naquela
noite, dá conta de que em dias nos quais acontecem muitos crimes o
prédio da DP fica pequeno para a quantidade de gente que aguarda em pé
ou sentada nas três cadeiras da antessala do local onde são feitos os
BOs. “Isso aqui fica parecendo o Walfredo”, comparou, referindo-se ao
maior hospital do Estado. Dois computadores são utilizados para os
registros. “Em casos mais constrangedores, como agressões e estupros, é
complicado. Quem está na sala escuta tudo o que a vítima nos relata”,
contou outro agente. Enquanto a TN esteve na DP Sul, por volta das 22h,
uma mulher chegou para prestar queixa sobre uma agressão sofrida e
precisou dizer na frente de todos o motivo da ida à delegacia, enquanto
chorava. A Plantão Zona Sul fica ao lado do Centro de Detenção
Provisória de Candelária, na avenida Prudente de Morais. Sem iluminação e
placa indicativa, a DP é comumente confundida pelos usuários com o CDP
recorridas vezes, como presenciou a reportagem.
Falta estrutura para investigaçõesPara
não conhecermos somente a realidade de uma das delegacias de Plantão,
decidimos atravessar a ponta e seguir até o conjunto Panatis, para saber
da Zona Norte. Chegamos às 23h e nos deparamos com uma estrutura
semelhante. Naquela noite eram cinco agentes e um delegado de plantão.
Foram 23 BOs registrados até as 3h, entre homicídio, roubos e um estupro
de vulnerável. A maior reclamação entre os policiais e o bacharel que
comandava a equipe, que também preferiram resguardar a identidade, é
relativa a uma discussão que perdura entre as partas de Segurança e
Defesa Social e Justiça e Cidadania. A custódia de presos por parte da
Polícia Civil. Eram três homens e uma mulher encarcerados e um
adolescente apreendido até o amanhecer. Os agentes relataram que quase
todos os dias têm resistência por parte dos CDPs para o recebimento das
pessoas detidas. “Precisamos acionar a Delegacia da Grande Natal -
DPGran – para que ela exerça pressão e eles os recebam”, reclamou um
agente.
Outro problema recorrente nas duas delegacias, ainda de
acordo com os agentes da polícia, é o da manutenção dos equipamentos. Já
por volta das 4h da manhã, a equipe de reportagem presenciou os
policiais da Plantão Zona Norte chegaram na DP do lado Sul para pedir
auxílio dos colegas na impressão de alguns documentos. A impressora
havia quebrado.
Para o Sindicato dos Policiais Civis e Servidores
da Segurança Pública do Rio Grande do Norte (Sinpol/RN), as delegacias
de plantão funcionam como “bolsões de registros de ocorrência”. Djair
Oliveira, presidente do Sinpol, reclamou da falta de possibilidade de
investigação por parte dessas DPs, por conta da falta de estrutura de
trabalho. “Como não há mais delegacias pela cidade para se prestar
queixa, as plantões acabam servindo somente para isso”, explicou. “É
preciso esperar até o outro dia, quando as informações chegam à
delegacia distrital que responde pelo lugar onde aconteceu o crime, para
que se dê início às apurações”, criticou.
A delegada Ana Cláudia
Saraiva Gomes, presidente Associação dos Delegados de Polícia Civil,
concorda com Oliveira. Ela acrescenta que há um projeto na Adepol que
prevê a criação de mais duas Dps de Plantão, para que se possa desafogar
o trabalho dos policiais. “Elas funcionariam junto com uma Divisão de
Homicídios, para que os profissionais pudessem fazer os registro sem se
preocupar com o local de crime em casos de assassinatos”, detalhou Ana
Cláudia. O delegado-geral, Ricardo Sérgio Costa Oliveira, voltou a
afirmar que a Polícia Civil trabalha com um efetivo inferior ao
necessário para que se tenha um resultado satisfatório. Em matéria
publicada nesta semana na TRIBUNA, Ricardo Sérgio disse que precisa de
pelo menos 50% a mais do que o efetivo disponível atualmente para dar
conta das investigações de crimes que ocorrem no estado. A Sesed foi
procurada par falar sobre o assunto mas nem o titular da pasta, nem o
secretário-adjunto atenderam os celulares.
95% dos homicídios não são desvendadosDe
acordo com órgãos fiscalizadores da Segurança Pública estadual, em
torno de 95% dos homicídios não são desvendados, por falta de provas
técnicas. Um levantamento recente feito pelo Conselho Estadual de
Direitos Humanos comprovou que dos 444 homicídios ocorridos em Natal ao
longo de 2012, somente 22 deles foram elucidados, um percentual de 4,95%
do total. Somente nos primeiros quatro meses deste ano, 471 pessoas
assassinadas no Rio Grande do Norte. Além da vertiginosa escalada da
violência, o primeiro Diagnóstico da Perícia Criminal no Brasil,
elaborado ao longo de 2012 e publicado em fevereiro deste ano pela
Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp), posiciona o instituto
técnico de perícia potiguar entre os de pior estrutura humana e
material dentre todos os avaliados em todo o país.
No texto da
apresentação do Diagnóstico, assinado pela titular da Senasp, Regina
Miki, a perícia é apontada como um “fator fundamental para realização de
investigações inteligentes e profissionais, que resultem na
identificação do criminoso e na produção de provas que possibilitem sua
condenação”. Para isto, porém, Regina Miki defende o “reconhecimento da
importância do investimento” na perícia. No Estado potiguar, porém, os
dados refletem uma realidade divergente.
Aqui, a média é de 1,51
peritos por habitante, segundo dados do relatório da Senasp. Com duas
Unidades de Criminalística, sendo uma em Natal e outra em Mossoró, os 48
peritos criminais que atuam no Instituto Técnico e Científico de
Polícia (Itep/RN), se dividem entre as respectivas
Conheça a estrutura da Polícia Civil do RN- Polícia Civil possui 1.484 servidores, entre delegados, escrivães e agentes;
- Delegado-geral quer, no mínimo, mais 742 servidores para dar conta das investigações;
- Dez delegacias funcionam em regime de plantão em todo o Estado;
- Somente Natal e Mossoró possuem equipe específica para as DPs de Plantão;
- Delegados chegam a acumular trabalho de até 11 delegacias.
Tribuna do Norte